Academia, periferia e fotografia: o tripé que sustenta a trajetória de Dante Gastaldoni

Foto: João Roberto Ripper

No ano do centenário da UFRJ e no mês em que é comemorado o Dia do Repórter Fotográfico, convidamos Dante Gastaldoni para um papo sobre profissão, academia, projetos e conjuntura atual. Gastaldoni é jornalista, cientista social e leciona na Escola de Comunicação da UFRJ há 37 anos. Atualmente, é também coordenador do projeto Fotografia, Periferia e Memória.

Com orgulho de integrar o quadro de docentes da UFRJ e insatisfeito com a gestão do atual governo frente às demandas das universidades públicas, o professor fala sobre a sua experiência notável na primeira universidade do país. “É uma honra que carrego comigo. Interagir com os colegas, funcionários e alunos é um privilégio raro. Poucas coisas me incomodaram tanto no atual governo como a tentativa sórdida de sabotar o trabalho feito nas universidades públicas, associadas à balbúrdia e com suas verbas diminuídas, para mascarar uma política calcada no ensino particular e nas privatizações de maneira geral. Viva o centenário da UFRJ. Que outros séculos se sucedam para o bem do Brasil”.

Como jornalista, Gastaldoni assumiu, entre outras funções, o cargo de editor do Jornal do Brasil. Em sua passagem pelo veículo, ele destaca o momento quando notou que imagens e textos eram duas partes importantes de uma composição. “Percebi que não estavam brigando para sobrepujar um ao outro. Quanto mais complementares fossem, mais impacto jornalístico teriam. Nada como uma boa foto, bem diagramada na página, dialogando com título, legenda e texto”, afirma.

Os caminhos da profissão

“Um mercado cada vez mais retraído e, paradoxalmente, cada vez mais carente de imagens”. É assim que o professor descreve o ramo da fotografia atualmente. Ele conta que a partir dos anos 2000, as editorias de fotografia dos grandes jornais reduziram as suas equipes, entretanto, no mundo hiper conectado e com alta velocidade de informações, as imagens ganharam uma dimensão nunca vista. “Aí estão as redes sociais para corroborarem com aquilo que Roland Barthes, ainda em 1980, já chamava de Civilização da Imagem. Para dar conta dessa demanda, os coletivos de fotógrafos, os midiativistas e, principalmente, os fotógrafos independentes se multiplicaram. Atenção: este me parece ser o caminho a seguir! Nas últimas edições do World Press Photo, uma parte significativa das fotos premiadas tem sido assinada por fotógrafos independentes”.

Academia, periferia e fotografia – três forças que, juntas, se potencializam

Dentre as inúmeras realizações profissionais do jornalista, há também a coordenação, ao longo de 11 anos, da Escola de Fotógrafos Populares da Maré. O projeto aconteceu em um dos maiores complexos de favelas do Rio de Janeiro e deixou o seu legado à região. “Mais do que formar fotógrafos, a Escola formava cidadãos. Muitas pessoas que não enveredaram pela fotografia mudaram suas vidas depois do curso. Costumo dizer, com indisfarçável orgulho, que ajudei a pavimentar uma via de mão dupla entre a periferia e a academia. Um caminho que levou vários universitários a cursarem a Escola, na condição de ouvintes, e vários moradores de favelas a ingressarem na universidade”. O ex-coordenador relata que hoje os antigos alunos da instituição cursam graduação em universidades públicas, alguns já no mestrado ou doutorado. 

Aos fotógrafos, alguns conselhos:

Dono de um repertório admirável, Gastaldoni deixa alguns direcionamentos para aqueles que desejam seguir na profissão: “leiam muito – literatura, filosofia e poesia, em especial – ouçam música, se debrucem sobre as fotos de diversos autores e, aos pouquinhos, comecem a fazer ensaios fotográficos de longa imersão. Dediquem um tempo aos seus temas. Tenho cá comigo que um fotógrafo, assim como um escritor, é tão bom quanto as histórias que é capaz de contar”.

MINI BIO

Dante Gastaldoni, 70, é jornalista e cientista social formado pela Universidade Federal Fluminense, com mestrado em Fotografia no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFF. Como jornalista, foi repórter, redator e editor do Jornal do Brasil. Como professor universitário, atuou na UFF (1980/2016) e, desde 1983, leciona na Escola de Comunicação da UFRJ. Entre 2004 e 2015, a convite de João Roberto Ripper, trabalhou como coordenador acadêmico na Escola de Fotógrafos Populares, Maré, RJ, cuja produção ganhou visibilidade em reportagens, livros e inúmeras exposições de fotografia exibidas no Brasil e no exterior. Em 2015 criou o coletivo Fotografia, Periferia e Memória, composto basicamente por fotógrafos populares e, desde então, seus integrantes já se apresentaram em mais de 30 cidades de 13 estados brasileiros.

Foto: João Roberto Ripper