Coluna “Três Perguntas, Editora Revan”

A grave crise estrutural nos presídios brasileiros gera diversos debates de norte a sul do país. A privatização de presídios é compatível com o Estado Democrático de Direito, dado seu aparente conflito com a dignidade da pessoa humana e o princípio da isonomia? José Adaumir Arruda da Silva, autor da obra “A Privatização de Presídios: uma ressocialização perversa: (in) Compatibilidade com o Estado Democrático de Direito”, participa da primeira edição da nossa série “Três Perguntas”. Confira:

Por que algumas correntes colocaram a privatização dos presídios como solução do sistema prisional brasileiro?
Os defensores da privatização apresentam basicamente três argumentos para justificar a privatização.
Primeiro: O Poder Público seria incompetente e burocrático. Por outro lado, a iniciativa privativa teria maior eficiência de gestão porque trabalha com resultados e poderia administrar bem melhor o sistema penitenciário, sem corrupção, sem superlotação, sem rebeliões. Uma gestão otimizada. Esta justificativa não se sustenta. Se admitirmos que o Poder Público é incompetente para gerir a coisa pública teríamos que terceirizar a administração do próprio Estado. Também não se pode afirmar que nos presídios privados ou com gestão terceirizada não há possibilidade de rebeliões. O presídio Anísio Jobim, em Manaus, tem administração privada e em janeiro de 2017, houve uma rebelião com 56 mortes. Ademais, na experiência de parceria Público-Privada como a de Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, há uma espécie de seleção dos presos, para que não coloquem em dúvida a reputação do sistema privatizado.
Segundo: Os custos para o erário público seriam menores, haveria uma economia para o Estado, porque a iniciativa privada teria uma gestão mais racional dos recursos.
Esta justificativa também não procede, porque nos presídios privados é o Poder Público que remunera o parceiro privado por cada pessoa presa, e diga-se, com valores bem mais elevados do que se gasta nos presídios públicos. A média do custo por preso no sistema oficial é de R$ 2.400,00, enquanto nos presídios privados essa média ultrapassa os R$ 3.500,00.
Terceiro: Os presídios privados, por não terem superlotação e disponibilizarem trabalho aos presos, cumpririam a finalidade ressocializadora da pena.
Esta justificativa é uma promessa que não se pode afirmar que se cumpra: a ressocialização, pois depende tão só do querer do apenado. Ademais, a oferta de trabalho é pequena e não alcança a todos. Os que trabalham são remunerados abaixo do salário mínimo. O trabalho ofertado não leva em consideração as aptidões do condenado, pelo que não garante sua profissionalização, que possa ser utilizada após conquistar a liberdade.

Qual é a solução para termos um sistema prisional digno?
A medida principal seria adequar o número de presos ao número de vagas existentes. A superlotação carcerária é o problema catalizador de todas as mazelas do sistema prisional brasileiro. A superlotação inviabiliza a individualização da pena e todos os direitos dos presos sejam provisórios ou condenados. É preciso inaugurar uma nova política criminal no País, que de um lado, crie filtros de entrada no cárcere e de outro, amplie a porta de saída. Ainda há uma excessiva quantidade de presos provisórios no Brasil, aproximadamente 40%. O tráfico de entorpecentes é o responsável por 28% do aprisionamento de homens e aproximadamente 50% das mulheres presas, o que aponta que o Brasil deve adotar uma nova política de drogas. É preciso que se desenvolvam sistemas e que se estruturem os órgãos atuantes na execução da pena para que os apenados tenham acesso aos direitos de livramento condicional, progressão de regime, indulto e extinção de pena em tempo hábil, para que não permaneçam no cárcere mais que o tempo devido.

Em um curto e médio prazo, o que fazer a fim de melhorar os presídios do país?
1- Investimento no sistema penitenciário para reestruturar os presídios absolutamente sucateados, com recursos do FUNPEN;
2- Aplicação do princípio do “numerus clasulus”, adequando a população carcerária a vagas existentes, antecipando a saída de presos condenados já próximos de alcançar direito ao livramento condicional e ao regime aberto domiciliar;
3 – Oferta de trabalho a todos os presos, e na impossibilidade, aplicação da remição ficta, ou seja, se o preso deseja trabalhar e o Estado não oferta, sendo um direito do preso condenado, o mesmo teria direito a remir a pena sem efetivo trabalho, porquanto não está trabalhando por motivo alheio a sua vontade;
4- Descriminalização do uso de drogas.

 

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